Greve Geral de 1917: onde ocorreu, causas, objetivos e consequências
A Greve Geral de 1917 foi uma grande mobilização operária brasileira, gerada por más condições de trabalho, carestia e repressão, marcando o início da luta por direitos trabalhistas no Brasil.
![]() Trabalhadores em greve numa fábrica de São Paulo em 1917.
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Introdução: o que foi, quando e onde ocorreu
A Greve Geral de 1917 foi o primeiro movimento grevista de grandes proporções no Brasil, marcado por sua abrangência, organização e impacto nas relações entre o Estado, o empresariado e a classe trabalhadora. Deflagrada em São Paulo no mês de julho daquele ano, a paralisação rapidamente se alastrou para outras cidades, como Rio de Janeiro e Porto Alegre. Mais do que uma manifestação isolada, a greve revelou profundas tensões sociais, econômicas e políticas, tornando-se um marco histórico na luta por direitos trabalhistas no país.
Contexto histórico
Durante a década de 1910, o Brasil vivenciava intensas transformações econômicas e sociais. A urbanização e o crescimento industrial, particularmente em centros como São Paulo, intensificaram o recrutamento de trabalhadores para as fábricas, muitos deles imigrantes europeus, em especial italianos. As condições de trabalho eram precárias: jornadas extensas, salários baixos, ausência de direitos básicos e um ambiente insalubre.
Outro aspecto importante foi Primeira Guerra Mundial, iniciada em 1914, que provocou inflação e escassez de gêneros alimentícios, agravando ainda mais a situação da classe trabalhadora. Nesse contexto, surgiram movimentos operários inspirados por ideologias como o anarquismo e o socialismo, que pregavam a luta direta contra a exploração capitalista.
Causas da greve:
- Exploração da mão de obra operária: os trabalhadores enfrentavam longas jornadas que variavam entre 12 e 14 horas diárias, salários reduzidos e ambientes insalubres.
- Influência ideológica do anarquismo: muitos imigrantes trouxeram consigo ideias libertárias e anarquistas, que pregavam a autogestão, o sindicalismo combativo e a greve como forma de resistência.
- Aumento do custo de vida: a inflação causada pela guerra encareceu os alimentos e produtos básicos, tornando insustentável a vida urbana para os mais pobres.
- Ausência de legislação trabalhista: até então, não havia leis que garantissem férias, descanso semanal, limite de jornada ou segurança no trabalho.
- Repressão policial sistemática: as manifestações trabalhistas anteriores foram brutalmente reprimidas, o que aumentou a tensão e o espírito de enfrentamento da classe trabalhadora.
Os objetivos dos grevistas:
Os grevistas reivindicavam uma série de melhorias imediatas e estruturais. Entre os objetivos centrais estavam: a redução da jornada de trabalho para oito horas diárias, o aumento geral de salários, o fim do trabalho infantil, a liberdade para a organização sindical, melhores condições de trabalho nas fábricas e o fim da repressão policial às manifestações operárias.
Quem foram os líderes principais
Embora não tenha havido uma liderança centralizada formal, a greve contou com a atuação de diversos militantes anarquistas e dirigentes operários que organizaram assembleias, panfletagens e comitês de greve.
Entre os nomes mais proeminentes estavam Edgard Leuenroth, jornalista e tipógrafo, responsável pela imprensa operária; além de militantes como Gigi Damiani e Oreste Ristori, que atuavam junto aos sindicatos e grupos anarquistas da época. Esses líderes, ligados sobretudo à imprensa operária e às ligas de resistência, foram essenciais para a articulação do movimento.
Principais fatos e eventos que ocorreram durante a greve
A greve teve como estopim a morte do operário espanhol José Martinez, atingido por tiros durante uma manifestação no bairro do Brás. Seu velório transformou-se em um ato de massa que mobilizou milhares de trabalhadores. A partir daí, greves se alastraram por fábricas, tipografias, oficinas e estabelecimentos comerciais.
O movimento ganhou força com a criação de comitês de greve e com a adesão de diferentes categorias profissionais. Ocorreram confrontos com a polícia, saques de armazéns e barricadas em ruas da cidade. O Exército foi convocado para reforçar a repressão. Apesar disso, os grevistas conseguiram manter a paralisação por várias semanas, revelando um alto nível de organização e resistência.
Como terminou
A greve começou a se esvaziar no final de julho de 1917, após a promessa de algumas concessões por parte de industriais e do governo, além do cansaço dos trabalhadores e da repressão violenta que se intensificava. A intervenção da Igreja e de representantes da burguesia liberal moderada também contribuiu para a busca de uma saída negociada. Apesar do fim do movimento, parte das reivindicações foi atendida, ainda que parcialmente, como o aumento de salários e a promessa de melhores condições nas fábricas.
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Manifestação de operários durante a greve geral de 1917 em São Paulo |
Principais consequências:
- Consolidação do movimento operário urbano: a greve de 1917 foi um marco na formação de uma consciência de classe mais ampla entre os trabalhadores, estimulando a criação de sindicatos mais estruturados.
- Repressão e vigilância do Estado: o governo intensificou a repressão aos movimentos operários, com perseguições, prisões e deportações de lideranças estrangeiras.
- Legado político: a greve influenciou outras mobilizações posteriores, como a greve de 1919 e a de 1920, além de contribuir para o surgimento de partidos voltados às causas operárias.
- Despertar da elite política: setores da elite passaram a reconhecer a necessidade de reformas trabalhistas para evitar novas explosões sociais.
- Avanço das discussões sobre direitos trabalhistas: embora não tenha resultado imediato em leis, a greve pressionou a discussão pública e o debate parlamentar sobre a regulamentação do trabalho no Brasil.
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Repressão policial contra trabalhadores em greve na cidade de São Paulo (1917). |
O que essa greve representou?
A Greve Geral de 1917 representou, assim, um divisor de águas na história do movimento operário brasileiro, revelando as contradições do modelo de industrialização nascente e a urgência da inclusão de direitos sociais na agenda nacional.
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Por Jefferson Evandro Machado Ramos (graduado em História pela USP)
Publicado em 23/04/2025
ROIO, José Luiz del. A Greve de 1917: os Trabalhadores Entram em Cena. São Paulo: Alameda, 2017. Editorial,